Esse livro me foi dado por uma pessoa especial, que foi muito importante para mim durante uma fase difícil. Por esse e outros motivos, acho que esse compilado visceral de desventuras médicas dos séculos passados será também sempre especial.
O livro é Medicina Macabra, publicado pela Dark Side Books, editora que sempre me impressionou pela qualidade do material dos livros, diagramação, arte interna e capas. Trata-se de uma série de textos retirados de artigos científicos antigos, de 1600 até 1900, recheados de comentários para traduzir o linguajar médico ou só para adicionar um tempero cômico mesmo.
O livro é dividido em sete seções, denominadas jocosamente de “incisões”. A primeira é “Vergonha alheia”, onde se fala muito de aflições a saúde que envolvam órgãos sexuais. Depois temos “Insólita medicina”, que trata de casos bastante curiosos e de veracidade questionável a luz da medicina moderna. A seguir temos “Remédios irremediáveis”, que narra tentativas terapêuticas antigas que poderiam fazer mais mal do que bem. Na sequência temos “Cirurgias macabras”, com narrativas de procedimentos dolorosos ou inusitados. Interessante que essa seção mostra o quanto principalmente a cirurgia evoluiu e quão temida ela foi. Então há “Curas extraordinárias”, que trata de pacientes que se curaram ou sobreviveram de forma quase milagrosa. Já “Histórias macabras” e “Perigos escondidos” me pareceram seções com histórias bem distintas em suas narrativas, seja de acidentes que resultaram em lesões até descrições quase inacreditáveis na atualidade.
Interessante que há uma seção específica para histórias vergonhosas, o que geralmente envolve o reto ou a uretra de indivíduos, geralmente do sexo masculino, fazendo coisas que acabaram dando errado de alguma maneira. Achei impressionante ainda como vários dos destinos dos pacientes citados são terríveis, com a descrição em uma forma praticamente leiga, mas com muita frieza frente à morte.
Os comentários nem sempre são muito úteis. Diversas vezes tratam-se apenas de trocadilhos, nem sempre tão bem compreendidos em português, mas adaptados de alguma maneira. Outras vezes são explicações, principalmente de anatomia, sobre estruturas que os textos técnicos citam, mas que para o leitor sem formação na área podem parecer difíceis de imaginar.
Muitas das vezes me peguei duvidando de relatos, considerando o quão fantasiosos são e que na época em que foram escritos, muitas vezes, bastava o nome de um padre ou figura importante de autoridade na região assinada no artigo para que ele fosse publicado em revistas científicas e dado como verdadeiro. Não há comprovações em muitos casos e mesmo as fontes são de caráter duvidoso. É inegável que houvesse menos comprovação e contra isso não posso lutar, mas os casos de combustão espontânea ou dos dentes explosivos, por exemplo, são descrições praticamente ficcionais.
O livro é ricamente ilustrado com desenhos frequentemente de anatomia e cirurgia, demonstrando em alguns momentos a estrutura anatômica correta, em outros algo nada relacionado com o relato. Mesmo nesses casos, ainda são desenhos interessantes e me diverti ao nomear mentalmente os ossos, músculos, vasos e nervos.
Pela proximidade com anatomia e fisiologia, muitas das vezes me peguei lembrando da faculdade de medicina, revivendo conceitos e questionando explicações do livro com base neles. Divertido, sem dúvida, embora não tão macabro assim, para mim foi uma leitura leve e divertida que não só demonstrou os felizes avanços da medicina como também que com o passar dos séculos os pacientes continuaram os mesmos.
Arte em Progresso 